Espelhos – Personagens do novo testamento – Segunda Parte

Sejam praticantes da palavra, e não apenas ouvintes, enganando-se a si mesmos. Aquele que ouve a palavra, mas não a põe em prática, é semelhante a um homem que olha a sua face num espelho e, depois de olhar para si mesmo, sai e logo esquece a sua aparência. Mas o homem que observa atentamente a lei perfeita que traz a liberdade, e persevera na prática dessa lei, não esquecendo o que ouviu mas praticando-o, será feliz naquilo que fizer – Tiago 1.22 a 25

 

INTRODUÇÃO

Continuando a considerar a Bíblia como um espelho, gostaríamos de considerar, nesta segunda parte alguns personagens do Novo Testamento.

Vamos expor de forma comparativa os seguintes personagens:

  1. Herodes, Pilatos e Jesus
  2. O ladrão impenitente, o ladrão penitente e Jesus
  3. O filho mais novo, o filho mais velho e o pai

Vamos nos valer unicamente do evangelho de Lucas para essa exposição.

  1. HERODES, PILATOS E JESUS

Jesus ensinou:

Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas – Mateus 6.33

A busca pelo reino de Deus se opõe à busca de nossos próprios interesses. Para buscar o reino eu preciso me conscientizar de que preciso transcender minhas próprias demandas pessoais e interesses individuais em prol de algo maior que eu, um reino que inclui, que tem no próximo seu objetivo.

Não está buscando o reino de Deus quem vive unicamente em busca de seus interesses. É incompatível com a busca pelo reino de Deus coisas tais como egoísmo, egocentrismo e egotismo.

Então Pilatos disse aos chefes dos sacerdotes e à multidão: Não encontro motivo para acusar este homem. Mas eles insistiam: Ele está subvertendo o povo em toda a Judéia com os seus ensinamentos. Começou na Galileia e chegou até aqui.  Ouvindo isso, Pilatos perguntou se Jesus era galileu. Quando ficou sabendo que ele era da jurisdição de Herodes, enviou-o a Herodes, que também estava em Jerusalém naqueles dias. Quando Herodes viu Jesus, ficou muito alegre, porque havia muito tempo queria vê-lo. Pelo que ouvira falar dele, esperava vê-lo realizar algum milagre. Interrogou-o com muitas perguntas, mas Jesus não lhe deu resposta. Os chefes dos sacerdotes e os mestres da lei estavam ali, acusando-o com veemência. Então Herodes e os seus soldados ridicularizaram-no e zombaram dele. Vestindo-o com um manto esplêndido, mandaram-no de volta a Pilatos. Herodes e Pilatos, que até ali eram inimigos, naquele dia tornaram-se amigos – Lucas 23.4 a 12

 

  1. HERODES

Herodes representa o populismo e a politicagem – a política da conveniência. Herodes é o típico fanfarrão, um camaleão político asqueroso.

O Herodes citado por Lucas é o Herodes Antipas. Depois da morte de Herodes, o Grande, seus domínios foram divididos entre seus três filhos: Arquelau (Mt 2.22), Filipe (Mc 6.17) e Antipas, o Herodes que aparece durante a idade adulta de Jesus, quando este exercia seu ministério.

Como tetrarca da Galileia (Lc 3.1; At 13.1; Mc 8.15), Herodes Antipas governou de 4 a 39 d.C. Ele mandou decapitar João Batista (Mt 14.3-12; Mc 6.1719; Lc 3.19,20) e posteriormente teve dúvidas sobre se Jesus era João que voltara à vida (Mt 14.1,2; Mc 6.14-16; Lc 9.79).

Lucas mostra certo interesse pela família herodiana, pois é o único evangelista que situa sua narrativa dentro dos eventos da história do império. Joana, a esposa de um dos oficiais de Antipas, tornou-se seguidora de Cristo (Lc 8.3). Jesus repreendeu Herodes “à revelia”, ao chamá-lo de “aquela raposa” (Lc 13.31-33) e foi levado à presença dele quando Pilatos tentou sem sucesso evitar a exigência dos líderes judeus pela crucificação de Cristo (Lc 23.6-16). (Quem é Quem na Bíblia)

Para seus fãs, os herodianos, ele representava a manutenção do poder nas mãos da elite dominante. Gente rica e poderosa apoiavam o governo sanguinário e as atitudes déspotas de Herodes. Na tentativa de desacreditar a mensagem de Jesus eles eram capazes até de se associar aos fariseus que eram ferrenhos opositores do regime herodiano.

Então os fariseus saíram e começaram a planejar um meio de enredá-lo em suas próprias palavras. Enviaram-lhe seus discípulos juntamente com os herodianos que lhe disseram: “Mestre, sabemos que és íntegro e que ensinas o caminho de Deus conforme a verdade. Tu não te deixas influenciar por ninguém, porque não te prendes à aparência dos homens. Dize-nos, pois: Qual é a tua opinião? É certo pagar imposto a César ou não? ” Mas Jesus, percebendo a má intenção deles, perguntou: “Hipócritas! Por que vocês estão me pondo à prova? Mostrem-me a moeda usada para pagar o imposto”. Eles lhe mostraram um denário, e ele lhes perguntou: “De quem é esta imagem e esta inscrição? ” “De César”, responderam eles. E ele lhes disse: “Então, dêem a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. Ao ouvirem isso, eles ficaram admirados; e, deixando-o, retiraram-se – Mateus 22.15 a 22

 

  1. PILATOS

Pilatos representa o imperialismo, o totalitarismo militar e político, a truculência e a conivência política.

Pôncio Pilatos foi um oficial romano (procurador ou prefeito) relativamente cruel que governou a Judéia de 26 a 36 d.C., inclusive no período do ministério de Cristo (Lc 3.1). Lucas 13.1 diz que ele, após matar alguns galileus, misturou o sangue deles com o sangue dos sacrifícios que oferecia. Aparece com maior destaque, entretanto, nos relatos dos quatro evangelhos sobre a crucificação de Jesus Cristo.

Marcos 15 relata como os membros do Sinédrio levaram Jesus perante Pilatos e pediram sua execução. Ele perguntou se Cristo era realmente o “rei dos judeus”, conforme era acusado por seus inimigos. Jesus respondeu com uma afirmação restrita (v. 2). Com relação às demais acusações, permaneceu em silêncio. A fim de seguir um costume de sempre libertar um prisioneiro na festa da Páscoa, Pilatos tentou soltar Cristo; os judeus, entretanto, clamaram pela libertação de Barrabás, assassino e líder de insurreições. Pilatos perguntou o que queriam que fizesse com Jesus e o povo exigiu sua crucificação. Apesar de acreditar que Cristo não cometera crime algum, ele consentiu, e ordenou que Jesus fosse açoitado e depois crucificado (v. 15). Mais tarde autorizou José de Arimatéia a retirar o corpo de Jesus da cruz e dar-lhe um sepultamento adequado (vv. 42-45). Para Marcos, Pilatos teve uma atitude muito mais de fraqueza do que de crueldade.

Mateus 27 apresenta o mesmo resumo dos eventos, mas acrescenta que a esposa de Pilatos teve um sonho com Jesus e aconselhou o marido a não se envolver com a morte “desse justo” (v. 19). Ele lavou suas mãos em público, declarando: “Estou inocente do sangue deste homem. A responsabilidade é vossa” (v. 24). Todos esses acréscimos demonstram o interesse de Mateus em estabelecer primariamente a culpa pela morte de Jesus sobre os líderes judeus. Nos vv. 62-66, os fariseus pediram e receberam de Pilatos um grupo de soldados para guardar o túmulo. Lucas 23 enfatiza ainda mais a convicção de Pilatos de que Jesus era inocente (veja vv. 4,13-16,22). Ele tentou transferir o problema para Herodes Antipas; tal manobra não deu resultado, apenas propiciou a reconciliação dos dois líderes (vv. 6-12).

A maneira branda pela qual Lucas descreve o comportamento de Pilatos em toda esta cena demonstra seu desejo de apresentar o cristianismo sob uma luz positiva para os líderes romanos daqueles dias. João 18 e 19 contêm o relato mais elaborado do julgamento de Jesus diante de Pilatos. Repetidamente o governador romano moveu-se entre os líderes judeus e Cristo, com o intuito de libertá-lo. João 18.33-38 menciona um diálogo entre Pilatos e Jesus. Cristo revelou que era Rei, mas não deste mundo, e fora enviado para dar testemunho da verdade. Pilatos, entretanto, não compreendeu a que verdade Jesus se referia. João 19.10 ilustra um tema importante para o evangelista — a soberania de Jesus Cristo, até com relação à sua própria morte.

João também esclarece qual foi o motivo primário de Pilatos para ceder diante dos líderes judaicos: o medo de ser considerado desleal a César (vv. 12,15). Os vv. 19-23 descrevem o título que Pilatos ordenou que fosse fixado acima da cruz de Jesus, o qual recusou-se a alterar: “Jesus de Nazaré, o Rei dos judeus”. Atos refere-se retrospectivamente à atitude pérfida de Pilatos na crucificação de Cristo (3.13; 4.27; 13.28), mas deixou claro que tudo isso foi em cumprimento das Escrituras, como parte da soberania de Deus.

Tanto Herodes como Pilatos demonstraram desprezo por Jesus, por Deus e pelo reino de Deus.

  1. JESUS

Jesus buscou o reino de Deus e nos ensinou a orar para que o reino de Deus venha. O silêncio de Jesus perante Herodes denuncia que não valia a pena responder a um homem que só pensa em si e em acumular poderes. Diante de Pilatos Jesus “fez uma boa confissão” afirmando ser rei e que Pilatos não teria nenhuma autoridade sobre ele se esta não lhe fosse dada de cima” – João 19.11. O império que Pilatos representava iria ruir e o reino de Deus permanece para sempre.

APLICAÇÃO

  1. Em que sentido me pareço com Herodes?
  2. Em que sentido me pareço com Pilatos?
  3. Em que sentido me pareço com Jesus?
  4. O LADRÃO IMPENITENTE, O LADRÃO PENITENTE E JESUS

Jesus ordena que nos arrependamos de nossos pecados:

Saindo de Nazaré, foi viver em Cafarnaum, que ficava junto ao mar, na região de Zebulom e Naftali, para cumprir o que fora dito pelo profeta Isaías: Terra de Zebulom e terra de Naftali, caminho do mar, além do Jordão, Galileia dos gentios; o povo que vivia nas trevas viu uma grande luz; sobre os que viviam na terra da sombra da morte raiou uma luz. Daí em diante Jesus começou a pregar: Arrependam-se, pois o Reino dos céus está próximo – Mateus 4.13 a 17

 

Paulo disse que Deus ordena a todos os homens que se arrependam:

No passado Deus não levou em conta essa ignorância, mas agora ordena que todos, em todo lugar, se arrependam – Atos 17.30

 

Lucas nos dá a conhecer a história de dois saltadores que foram crucificados juntamente com Jesus Cristo, um deles se arrepende e o outro não. Eles representam a humanidade em sua totalidade.

Dois outros homens, ambos criminosos, também foram levados com ele, para serem executados. Quando chegaram ao lugar chamado Caveira, ali o crucificaram com os criminosos, um à sua direita e o outro à sua esquerda. Jesus disse: Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que estão fazendo. Então eles dividiram as roupas dele, tirando sortes. O povo ficou observando, e as autoridades o ridicularizavam. Salvou os outros, diziam; salve-se a si mesmo, se é o Cristo de Deus, o Escolhido. Os soldados, aproximando-se, também zombavam dele. Oferecendo-lhe vinagre, diziam: Se você é o rei dos judeus, salve-se a si mesmo. Havia uma inscrição acima dele, que dizia: ESTE É O REI DOS JUDEUS. Um dos criminosos que ali estavam dependurados lançava-lhe insultos: Você não é o Cristo? Salve-se a si mesmo e a nós!  Mas o outro criminoso o repreendeu, dizendo: Você não teme a Deus, nem estando sob a mesma sentença? Nós estamos sendo punidos com justiça, porque estamos recebendo o que os nossos atos merecem. Mas este homem não cometeu nenhum mal. Então ele disse: Jesus, lembra-te de mim quando entrares no teu Reino. Jesus lhe respondeu: Eu lhe garanto: Hoje você estará comigo no paraíso – Lucas 23.32 a 43

 

Há um evangelho apócrifo que dá nomes aos dois salteadores. Ao penitente chama de Dimas e ao impenitente o evangelho chama de Gestas.

  1. O LADRÃO IMPENITENTE

O criminoso aqui citado por Lucas não era um criminoso comum. Ele não “batia carteira” em Jerusalém. Ele era um latrocida, uma pessoa que praticava o latrocínio, ou seja, ele roubava e matava suas vítimas. A vida das pessoas não lhe importava. Ele visava obter, com violência, o que não lhe pertencia por direito. Sua ficha corrida era extensa. Ele não se importava com a lei, com a sua própria consciência, nem mesmo com Deus. Ele não pensava no juízo divino sobre seus atos.

Uma vez preso, esses criminosos sabiam que o império romano não usaria de clemência com eles. A condenação para o crime de latrocínio era a morte por crucificação. O império achava que ao punir esse crime com severidade serviria para desestimulá-lo. Mas, o resultado dessa desastrosa lei foi a execução de milhares de criminosos nos muitos séculos do domínio romano.

O que impressiona nesse relato é que, mesmo estando sob tão severa condenação esse criminoso não demonstrava traços de arrependimento. No máximo podemos perceber em suas palavras a presença de remorsos. Lucas diz que ele lançava insultos a Jesus. Não somos informados sobre a natureza desses insultos. Certamente usava palavras de baixo calão, muito usual entre os criminosos. Além de insultar a Jesus ele ainda o desafia:  Você não é o Cristo? Salve-se a si mesmo e a nós!”. Insulta, desafia, se expressa com violência e desrespeito. Não há em seu coração traço algum de tristeza ou pesar pelas vidas que ceifou movido por ganância e maldade extremas.

Talvez não tenhamos como nos identificar plenamente com essa personagem. Não somos latrocidas, mas não são apenas os latrocidas que são impenitentes. Nós podemos desenvolver, com o tempo, uma postura impenitente.

Davi fala de sua experiência pessoal no salmo 32:

Enquanto escondi os meus pecados, o meu corpo definhava de tanto gemer. Pois de dia e de noite a tua mão pesava sobre mim; minha força foi se esgotando como em tempo de seca – Salmo 32.3 e 4

 

Somente com a confissão é que ele pode se ver livre do fardo insuportável:

Então reconheci diante de ti o meu pecado e não encobri as minhas culpas. Eu disse: Confessarei as minhas transgressões ao Senhor, e tu perdoaste a culpa do meu pecado – Salmo 32.5

 

O sábio aconselhou:

Quem esconde os seus pecados não prospera, mas quem os confessa e os abandona encontra misericórdia – Provérbios 28.13

 

O profeta Isaías profetizou:

Vejam! O braço do Senhor não está tão curto que não possa salvar, e o seu ouvido tão surdo que não possa ouvir. Mas as suas maldades separaram vocês do seu Deus; os seus pecados esconderam de vocês o rosto dele, e por isso ele não os ouvirá. Pois as suas mãos estão manchadas de sangue, e os seus dedos, de culpa. Os seus lábios falam mentiras, e a sua língua murmura palavras ímpias – Is 59.1 a 3

 

  1. O LADRÃO PENITENTE

Diferente de seu comparsa de crimes o “outro criminoso” sai em defesa de Jesus. Primeiro ele repreende o seu comparsa: “Você não teme a Deus, nem estando sob a mesma sentença?”. Há aqui um reconhecimento da necessidade de temer a Deus. Não sabemos nada sobre o passado destes criminosos, mas a fala do criminoso penitentes revela que ele teve uma criação piedosa. Provavelmente seus pais lhe ensinaram sobre Deus e o dever de temê-lo. Por alguma razão ele se desviou do ensino de seus pais e trilhou pelo mundo do crime. Mas a semente da verdade, plantada em seu coração, nesta hora derradeira de sua existência, aflora e o faz lembrar que há um Deus no céu e que temê-lo é a coisa mais sensata a se fazer.

Num segundo momento ele reconhece que a punição que deram a ele e a seu comparsa era justa: “Nós estamos sendo punidos com justiça, porque estamos recebendo o que os nossos atos merecem”. Há muito bom senso nessa sua fala. Por mais que alguém pudesse questionar a severidade da lei romana, ela estava estabelecida e os que a desafiassem deveria reconhecer que fizeram isso por sua conta e risco. O criminoso deveria reconhecer que o Estado punia e que ele, e somente ele, era o responsável por suas transgressões. O criminoso penitente não coloca a culpa no Estado, ele a toma sobre si.

Num terceiro momento ele defende a inocência de Jesus Cristo: “Mas este homem não cometeu nenhum mal”. Indo além da confissão penitente ele passa à confissão da inocência de Cristo. A confissão de nossa culpa e a confissão da inocência de Cristo são duas faces da mesma moeda. Ao confessar-me culpado, reconheço nesse ato que a morte de Cristo foi substitutiva, ou seja, ele morreu no meu lugar.

Por fim, o criminoso penitente lança uma súplica a Jesus: “Jesus, lembra-te de mim quando entrares no teu reino”. O reconhecimento da culpa pessoal e da inocência de Cristo serviram de preâmbulo para um clamor por salvação. Ele estava numa situação angustiosa e desesperadora, como um náufrago que busca um pedaço do navio para se agarrar. Ele percebeu que poderia ser salvo. Seu corpo já estava condenado, mas sua alma percebia alguma oportunidade de salvação.

Davi confessou seu pecado:

Pois eu mesmo reconheço as minhas transgressões, e o meu pecado sempre me persegue. Contra ti, só contra ti, pequei e fiz o que tu reprovas, de modo que justa é a tua sentença e tens razão em condenar-me. Sei que sou pecador desde que nasci, sim, desde que me concebeu minha mãe – Salmo 51.3 a 5

 

A narrativa de Lucas termina com a resposta de Jesus:

“Eu lhe garanto: Hoje você estará comigo no paraíso” – Lucas 23.43.

  1. JESUS

Nesse relato de Lucas Jesus é ofendido, desafiado e defendido. Ao que o ofendia e desafiava ele guardou silêncio. Ao que o defendia e confessava seu pecado Jesus ofereceu perdão e salvação.

APLICAÇÃO

  1. Em que sentido me pareço com o ladrão impenitente?
  2. Em que sentido me pareço com o ladrão penitente?
  3. Em que sentido me pareço com Jesus?
  • O FILHO MAIS NOVO, O FILHO MAIS VELHO E O PAI

O profeta Oséias disse que Deus prefere misericórdia a sacrifício:

Pois desejo misericórdia, não sacrifícios, e conhecimento de Deus em vez de holocaustos – Oséias 6.6

 

O reino de Deus é um reino de misericórdia. Os fariseus não sabiam o que era isso. Num incidente com Jesus eles ouviram a seguinte reprimenda:

Se vocês soubessem o que significam estas palavras: ‘Desejo misericórdia, não sacrifícios’, não teriam condenado inocentes – Mateus 12.7

 

A parábola do pai fala de misericórdia. Jesus, por misericórdia e compaixão “comia com pecadores”: Todos os publicanos e “pecadores” estavam se reunindo para ouvi-lo – Lucas 15.1

Os fariseus, desprovidos de misericórdia criticavam-no: Mas os fariseus e os mestres da lei o criticavam: “Este homem recebe pecadores e come com eles” – Lucas 15.2

Em resposta às críticas dos opositores Jesus contou a parábola do pai:

Jesus continuou: Um homem tinha dois filhos. O mais novo disse ao seu pai: Pai, quero a minha parte da herança. Assim, ele repartiu sua propriedade entre eles. Não muito tempo depois, o filho mais novo reuniu tudo o que tinha, e foi para uma região distante; e lá desperdiçou os seus bens vivendo irresponsavelmente. Depois de ter gasto tudo, houve uma grande fome em toda aquela região, e ele começou a passar necessidade. Por isso foi empregar-se com um dos cidadãos daquela região, que o mandou para o seu campo a fim de cuidar de porcos. Ele desejava encher o estômago com as vagens de alfarrobeira que os porcos comiam, mas ninguém lhe dava nada. Caindo em si, ele disse: Quantos empregados de meu pai têm comida de sobra, e eu aqui, morrendo de fome! Eu me porei a caminho e voltarei para meu pai, e lhe direi: Pai, pequei contra o céu e contra ti. Não sou mais digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus empregados. A seguir, levantou-se e foi para seu pai. Estando ainda longe, seu pai o viu e, cheio de compaixão, correu para seu filho, e o abraçou e beijou. O filho lhe disse: Pai, pequei contra o céu e contra ti. Não sou mais digno de ser chamado teu filho. Mas o pai disse aos seus servos: Depressa! Tragam a melhor roupa e vistam nele. Coloquem um anel em seu dedo e calçados em seus pés. Tragam o novilho gordo e matem-no. Vamos fazer uma festa e comemorar. Pois este meu filho estava morto e voltou à vida; estava perdido e foi achado. E começaram a festejar. Enquanto isso, o filho mais velho estava no campo. Quando se aproximou da casa, ouviu a música e a dança. Então chamou um dos servos e perguntou-lhe o que estava acontecendo. Este lhe respondeu: ‘Seu irmão voltou, e seu pai matou o novilho gordo, porque o recebeu de volta são e salvo’. “O filho mais velho encheu-se de ira, e não quis entrar. Então seu pai saiu e insistiu com ele. Mas ele respondeu ao seu pai: Olha! todos esses anos tenho trabalhado como um escravo ao teu serviço e nunca desobedeci às tuas ordens. Mas tu nunca me deste nem um cabrito para eu festejar com os meus amigos. Mas quando volta para casa esse seu filho, que esbanjou os teus bens com as prostitutas, matas o novilho gordo para ele! Disse o pai: ‘Meu filho, você está sempre comigo, e tudo o que tenho é seu. Mas nós tínhamos que comemorar e alegrar-nos, porque este seu irmão estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi achado – Lucas 15.11 a 32

 

No ano de 2004 eu palestrei num retiro de jovens da Igreja Evangélica Holiness de Londrina. Para facilitar a compreensão dos ouvintes eu dei nome aos personagens. Ao filho mais velho eu chamei Takashi e Toshio ao mais novo. Ao pai eu chamei de senhor Tanaka – Tanaka sansei.

Nesse contexto majoritariamente italiano quero dar nomes aos personagens:

Genaro será o nome do filho mais velho. Luigi será o nome do filho mais novo e Pietro será o nome do pai.

 

  1. O FILHO MAIS NOVO – LUIGI

A prodigalidade do filho mais novo é evidente. O texto indica que ele não somente dissipou os seus bens como também indica o modo como ele fez isso, ou seja, vivendo dissolutamente.

O advérbio grego asōtōs (pronuncia-se assotos) que significa pródigo, esbanjador, é usado unicamente nessa passagem. O advérbio aponta para um estilo de vida onde o agente moral não tem controle sobre seus gastos e vive como se não houvesse amanhã.

Asotia significa estar irremediavelmente doente e refere-se a um estilo de vida pelo qual se destrói a si próprio. É a “vida selvagem” do filho pródigo (Lucas 15,13 NVI). É a vida de “dissipação” resultante de beber vinho (Efésios 5:18 NVI). Comparar Tito 1:6; 1Pedro 4:3-4. A Bíblia fala contra uma vida desordenada, enquanto os gregos usavam o termo para significar uma vida desperdiçada ou luxuosa. A Bíblia ensina os crentes a evitar ambos os estilos de vida. (Holman Bible Dictionary, published by Broadman & Holman, 1991)

 

A prodigalidade do filho mais novo é vista pelos ouvintes de Jesus como um ultraje imperdoável. Jesus estava consciente da gravidade dos atos do filho perdido. A petulância dele em pedir a herança ao pai, a ousadia de vender a parte de sua herança e a irresponsabilidade na utilização desses recursos na terra distante causou uma impressão muito ruim aos ouvintes.

Todos os ouvintes de Jesus concordariam com a fala do pródigo: “Pai, pequei contra o céu e diante de ti; já não sou digno de ser chamado teu filho….” – Lc 15.18 e 19. De fato, o filho mais novo fez coisas inadmissíveis no contexto em que Jesus e seus ouvintes viviam. Jesus ao mostrar que os atos do filho mais novo eram injustificáveis, condena a vida dissoluta dos publicanos e pecadores. Jesus dá um veredicto desfavorável ao estilo de vida deles.

O grande diferencial, no caso do pródigo e dos representados por ele, é o arrependimento. Em momento algum Jesus tenta pintar um quadro favorável ao pródigo. Seus atos e atitudes são descritos de forma a chocar os ouvintes. Tudo o que foi atribuído ao pródigo é digno de repúdio e indignação.

Ao pintar um quadro tão repugnante aos ouvidos daquele público Jesus estava fazendo-os ver que não havia modo algum de justificar os atos e atitudes dos “publicanos e pecadores”. Jesus considera seus pecados dignos de repúdio e indignação, porém, e aí reside o grande diferencial, o pródigo se arrepende, tal como os ninivitas com a pregação de Jonas.

A última menção de Jesus ao pródigo o coloca caminhando em direção à casa paterna. A conversão do jovem perdido pode ser “colocada em xeque” nos termos que ele usa, porém, sua volta física à casa paterna, sob a ameaça da hostilidade dos circunstantes e a possibilidade de recusa do pai, demonstra que isso era tudo o que ele poderia fazer naquelas circunstâncias.

O jovem perdido estava de volta e não podia controlar a fúria dos seus conterrâneos e nem mesmo sobre a receptividade do pai ou ausência dela. Cabe ao pecador, uma vez convencido de seus pecados voltar-se para Deus em sincera atitude de arrependimento sem se importar com a possibilidade de ser mal interpretado pelos demais pecadores.

 

  1. O FILHO MAIS VELHO – GENARO

Que tipo de prodigalidade evidencia o filho mais velho?

Sua vida se revelou um grande desperdício de tempo e oportunidades. Ele viveu toda a sua vida como um escravo e não como um filho. Ele viveu na casa do pai sem ter comunhão com o pai. No final da parábola temos um escravo se dirigindo a um feitor e não um herdeiro conversando amistosamente com seu pai. Ele desperdiçou vida e oportunidades de viver dignamente como filho de um pai generoso. Bailey nos ajuda a compreender melhor essa questão da prodigalidade do filho mais velho ao citar Sa’íd:

A diferença entre ele e seu irmão mais novo era que o mais novo estaria distanciado e rebelde enquanto ausente da casa, mas o mais velho estava distanciado e rebelde em seu coração, enquanto estava na casa. O distanciamento e a rebeldia do filho mais jovem tornaram-se evidentes pelo fato de ele se ter rendido às suas paixões, e pelo seu pedido de abandonar a casa do pai. O distanciamento e rebeldia do filho mais velho tornaram-se evidentes em sua ira e em sua recusa de entrar na casa. […] A diferença entre eles é que o filho pródigo era um “pecador honrado” pelo fato de ser perfeitamente aberto para seu pai. Ele disse a seu pai tudo o que estava em seu coração. Mas o irmão mais velho era um “santo hipócrita”, porque escondia os seus sentimentos no coração. Ele permaneceu na casa todo o tempo, odiando seu pai. Ele nega-se a ter qualquer relacionamento com seu irmão, e desta forma nega qualquer relacionamento com seu pai. Ele diz: Este teu filho”, em vez de dizer “meu irmão”. Com esta declaração o filho mais velho se excluiu da família sagrada, e cominou a sentença de “proscrito” para si mesmo. (Idem, 1995, p. 243-244)

 

Bailey conclui:

Jesus está discutindo dois tipos básicos de homens. Um é ilegal sem a lei, e outro ilegal dentro da lei. Ambos são rebeldes. Ambos partem o coração do pai. Ambos acabam em um país distante: um fisicamente, o outro espiritualmente. O mesmo amor inesperado é demonstrado em humilhação, a ambos. Para ambos, esse amor é essencial, para que os servos se tornem filhos. (1995, p. 248)

 

  1. O PAI – PIETRO

A aceitação de Deus aos pecadores é vista nas ações do pai:

Vinha ele ainda longe, quando seu pai o avistou, e, compadecido dele, correndo, o abraçou, e beijou. E o filho lhe disse: Pai, pequei contra o céu e diante de ti; já não sou digno de ser chamado teu filho. O pai, porém, disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa, vesti-o, ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés; trazei também e matai o novilho cevado. Comamos e regozijemo-nos, porque este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi achado – Lc 15.20b a 23a

 

A respeito disso Bailey comenta:

As boas-vindas do pai são claramente um derramamento de graça. Mas digno de especial atenção para a nossa discussão é o comentário de Ibn al-Tayyb a respeito da razão para a omissão da oferta para se tornar um servo assalariado. Ele diz que o pródigo mudou de ideia “por ter visto o amor do seu pai”. O amor foi demonstrado e tornou-se visível. Isso operou uma mudança de ideia. O filho decidiu não se oferecer como servo. A disposição de se tornar servo assalariado por si mesma significava, para Ibn al-Tayyb, um arrependimento parcial. O arrependimento total aconteceu como resultado de uma demonstração de amor. (1995, p. 232)

 

APLICAÇÃO

  • Em que sentido me pareço com o filho mais novo?
  • Em que sentido me pareço com o filho mais velho?
  • Em que sentido me pareço com o pai?

 

CONCLUSÃO

CORAÇÃO IGUAL AO TEU – DIANTE DO TRONO

Dá-me um coração igual ao Teu,

Meu mestre

Dá-me um coração igual ao Teu […]

Ensina-me a amar o meu irmão

A olhar com Teus olhos

Perdoar com o Teu perdão

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